sexta-feira, 3 de julho de 2009

Quando a madrugada é quebrada por uma ligação de conteúdo preocupante, não adianta tentar dormir novamente. Ela não vai ser boa e nem relaxante.
E assim foi a minha: agitada. Acoredei mais cansada do que quando fui me deitar.
Dia 30/06, aniversário de uma das pessoas mais inteligentes que conheço e que tenho grande admiração: meu avô. 72 anos, pai, avô, guerreiro, marido, engenheiro, professor!
O trabalho não estava muito corrido hoje, mas outra notícia quebrou a continuidade do dia. Uma ligação, porém esta era para a colega de trabalho ao lado. Sua filha havia entrado em trabalho de parto.
E uma ideia não me saia da cabeça: quando alguém nasce, outra tem que morrer.
Logo, se a notícia da madrugada era a internação do ex, meu avô, com passado cardíaco condenado, fazendo aniversário e um bebê prestes a nascer... haveria a morte de um dos dois primeiros.
Com a certeza do bom estado de saúde do segundo, pensei: não pode ser. O ex vai morrer!
Mesmo sendo uma simples cirurgia de apêndice, sabe como são os médicos: humanos! Sendo assim, estão sujeitos ao erro. E essa certeza incerta vinda de sei lá onde: "o ex vai morrer" não me saía da cabeça.
Dizem que quando estamos prestes a morrer, nos aproximamos do início e a vida toda passa num flash.
E isso aconteceu não com o ex, mas com a dona desta certeza. Me aproximei do começo com ele, do "primeiro" sorriso, do "primeiro" abraço, da troca de olhares, das mãos, do toque, do beijo...
A vida que vivi com ele passou várias vezes diante dos olhos e foi possível sentir até o friozinho na barriga sentido naquela colação de grau da irmã.
O estômago embrulhado, gastrite atacou, tontura... ele vai morrer!!
Recebi uma ligação quebrando meu surto e estruturando o dia. Tudo correra conforme o planejado, o ex passava bem.
Dentre os três, a alegria, o medo e a chegada, fico feliz por só a chegada ter se concluído.
Mas algo estranho aconteceu: a morte tão perto de fato se deu, e uma parte dele morreu. Talvez seja por isso que a voz dele estava tão estranho ao telefone. Fico pensando que parte será esta.
Enfim, já em casa, jantando em frente à televisão, vi o noticiário: AIRBUS cai a caminho do Iêmen.
Quando alguém nasce, alguém morre. E, infelizmente, morreram. Espero que muitos tenham chegado.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Dia das mães

Durmo com a certeza que te tenho em meu ventre...
Sinto-te tão internamente.
Quero te proteger, então me encolho e te envolvo em meus contornos.
Te olho e meus olhos se enchem de lágrimas, quero te tocar, hesito. Não consigo, e por que não?
Logo eu que nunca te quis, na verdade ainda não quero, então talvez seja por isso. Agora é você quem olha, e nada mais importa, te tenho em meus braços. E sinto que você foi o que eu sempre esperei.
É você pequena, é você que completa meu vazio. Eu, sujeito faltante, você, objeto de desejo, meu grande outro. Para você, sou eu seu grande outro, quem te completa. Somos um só.
A dor nos braços da perda do filho, de tanto esticá-lo para alcança-te, te procuro, mas não te encontro.
Dizem-me:
- Não percebe? Ele já foi muito antes de ter chegado.
Outros
- Não vê? Ele não existe mais, virou pó.
Quando foi que te tiraram de mim, quando foi que te perdi? Foi na imensidão da vida, por entre meus dedos ou num piscar de olhos?
É difícil falar do que não se tem, mas mais difícil é sentir o que não existe. É inaceitável saber que não passou de um sonho. E que jamais vou poder te envolver nos braços, preencher todo espaço, e meu vazio.
Choro calada. As lágrimas escorrem pelo meu rosto de expressão vazia, antes tomado pela calma e alegria ao ver seus movimentos desajeitados e seu sorriso.
Deito, encolhida, com os joelhos em meu queixo, banhada em lágrima e sangue, e ainda te sinto.
Acordo com a tristeza de um ventre murcho e de braços vazios.





domingo, 15 de março de 2009

As vinte e oito mulheres

Ontem li sobre elas. Não o que alguém falou sobre; não as conheci através do olhar do outro. Nunca as vi, talvez nunca venha a conhecê-las, e nem elas a mim. Mas o importante é que as conheci. E isso fez com que eu pensasse no diferente.
Já tive que escrever redações autobiográficas, e na minha opinião, é difícil falarmos quem somos. Somos a junção de tudo, filho de um, pai de outro. Vizinho daquele, amigo desse. O que realmente nos torna únicos é aquilo que chamamos de essência. Há quem acredite que ela é construída, outros acham que nascemos com ela.
Já eu, acredito que nascemos com ela, e que, também, a construímos; um pouco de cada.
Nunca, como hoje, vi a importância que o meio tem na vida de alguém.
O que foi que aconteceu?
Onde foi que vidas seguiram caminhos tão opostos, onde foi que houve a separação? De quem foi a culpa? De quem é o medo?
A maioria delas mal sabe escrever. Mas já sabem de drogas, sabem vender, sabem se vender pra conseguir comprar. Comprar seu vício, sua droga, sua “saída”...
Lendo seus textos, não me pareceram reais. São meninas cheias de sonhos, cheias de culpa, cheias de amor.
Se não todas, mas a maioria relata da sua saudade de casa, da mãe, do colo.
Foi proteção que faltou, foi carinho?
Nem todas têm uma família desestruturada, nem todas são filhas de criminosos, traficantes ou alcoólatras. Todas são filhas, e quase todas são mães.
Naquelas folhas soltas de caderno, havia a infância perdida, havia sonhos... No canto, desenhos de corações, flores, e mimos. Lá se via um futuro, futuro desejado, mas não um certo. “Quando sair daqui vou voltar a estudar”, “quero ser veterinária”, “quero ser médica”, quero ser isso, quero fazer aquilo.
Talvez seus sonhos venham a se realizar um dia, talvez não.
Não posso julgar qual modo de levar a vida é mais fácil, é melhor. Até agora só conheço o meu.
Ter contato com vocês me trouxe um grande aprendizado e senso de realidade. Deixemos de olhar para nosso próprio umbigo, levantemos a cabeça. O mundo está aí e a diversidade nele.
Vinte e oito! Essa é uma pequena amostra das jovens criminosas do Estado de São Paulo.
“Ele tava de joelho, implorando pra viver. A arma tava na minha mão. O meu dedo escapou e apertei o gatilho. [...] O que é uma vida?” Parte integrante de uma das redações. Esta foi a que mais me impressionou. A única que questiona a existência de Deus, enquanto as outras acreditam piamente nele.
Não entendo o amor pelas mães que elas têm, não entendo porque continuar com alguém que te levou para esta vida e que te bate constantemente, não consigo entender porque a maioria dessas meninas voltam para a mesma vida de antes. A Fundação Casa de nada adiantou então?

Elas não são mais meninas, cresceram rapidamente. Agora são mulheres. As 28 mulheres que entraram e mudaram a minha vida.

Fiquei 3 meses sem postar, com a possibilidade de não voltar mais. Volto, então, com este texto. Bom ou não, precisava voltar. Tentei escrever outros, mas saíram muito pessoais, e na maioria das vezes nem saíram. Esse se distancia um pouco de mim, e me aproxima do outro...